O momento de desaceleração econômica pelo qual o país passa obriga as
empresas a repensar e a reestruturar rapidamente os modelos de negócios —
e você já deve estar sentindo isso na pele.
Afinal, uma das consequências é a exigência de que os profissionais se
tornem velozes para se adaptar às mudanças com agilidade. Somem-se a
isso as novas tecnologias (que não param de surgir e de se tornar
indispensáveis) e está criado o desafio: ou aprendemos a ter mais
flexibilidade para lidar com cenários diversos, ou vamos sofrer para
sobreviver.
Ter um alto poder de adaptação é uma competência altamente valorizada
no mercado de trabalho. Uma pesquisa desenvolvida pela Betania Tanure
Associados, consultoria de carreira de São Paulo, feita em 2014 com
1 000 executivos, mostra que mais de 50% das companhias brasileiras veem
a flexibilidade para resolver problemas como o principal fator que leva
a uma promoção.
Mudar pode ser assustador, mas é bom porque a adaptação aumenta a
velocidade de raciocínio, ajuda na tomada de decisão e torna as pessoas
mais resistentes à frustração. “Quem desenvolve a flexibilidade enxerga
as possibilidades trazidas pela crise em vez de se apegar ao
desconhecido e não fica paralisado”, diz Patricia Cotton, especialista
em transformação, do Rio de Janeiro.
Antes de se desesperar achando que sua carreira está correndo perigo,
saiba que há ferramentas capazes de mudar comportamentos. “Estamos
migrando da era do conhecimento para a era da criatividade, em que
profissionais e organizações são capazes de inovar conectados às
demandas reais do mundo”, afirma Patricia. Ter vontade e curiosidade de
aprender é o primeiro passo para se engajar numa trajetória de mudanças —
que será constante.
PARE DE RESISTIR
Os processos de adaptação, segundo a consultora Betania Tanure, passam
por quatro fases importantes: “eu preciso fazer a mudança”, “eu quero
fazer a mudança”, “eu sei fazer a mudança” e “eu faço a mudança” — na
vida real, essas etapas não ocorrem tão sequencialmente.
A percepção de que não se é valorizado pelas entregas, a redução de
convites para reuniões, além da emissão de comentários desmotivadores
diante das novidades (que costumam contaminar o ambiente) são sintomas
típicos de pessoas resistentes a reestruturações. A causa da apreensão
pode variar.
Muitos não se sentem desafiados ou precisam encontrar um propósito.
Alguns são inseguros quanto às próprias competências. Outros temem que
sua posição seja ocupada por gente mais jovem, disposta a receber
salário menor. “Para não perder o bonde, é preciso refletir sobre a
razão para a resistência e estruturar uma jornada de aprendizagem”,
afirma Betania.
A visão paternalista de que a empresa deve resolver todas as questões
dos profissionais não funciona mais, pois a instabilidade do mercado
dificulta previsões para o futuro de qualquer companhia. Fazer projeções
para cada funcionário, nessa realidade, é utópico.
Daqui para a frente, é preciso entender que carreira é uma questão de
responsabilidade individual — e que, para crescer, é necessário se
adaptar a novos (e até impensáveis) cenários. “A flexibilidade será
critério eliminatório para posições de liderança, especialmente em áreas
como marketing, vendas e tecnologia”, diz Fabricio Velasco, gerente da
Hays, empresa de recrutamento de São Paulo. Funcionários flexíveis são
úteis em diversas áreas e podem sobreviver aos mais severos processos de
reestruturação.
ESTABILIDADE X CRESCIMENTO
Entre a maioria dos profissionais, no entanto, o objetivo é alcançar a
estabilidade no emprego. As transformações corporativas, nesse contexto,
são vilãs. A cada programa de reestruturação implantado, estima-se que
33% dos empregados se declarem abertamente contrários e outros 33%
apresentem receio, conforme revela uma pesquisa feita por Seán Meehan,
professor de marketing e gestão do IMD, escola de negócios suíça.
“A porcentagem de indivíduos avessos às transições está próxima dos
50%, já que muita gente não dá publicamente sua opinião”, diz Seán (leia
a entrevista acima).
O especialista criou o conceito not in my back yard (Nimby) — “não no meu quintal”, em português — para explicar a reação negativa das pessoas diante de novos projetos.
Quanto mais engessada for a estrutura hierárquica da organização, maior
será a incidência de pessoas que usam a autoridade para barrar novas
iniciativas — uma aparente tentativa de proteção do próprio poder, que
pode, na verdade, colocar em xeque a progressão de carreira.
Atualmente, no Brasil, apenas 15% dos profissionais consideram seu
emprego estável, como mostra uma pesquisa da Hays, empresa de
recrutamento de executivos, que ainda revela que cerca de 60% dos
funcionários não estão buscando novos desafios dentro de suas funções.
Em consonância com esse comportamento, a pesquisa Talento Brasileiro,
da Etalent, que entrevistou mais de 1,3 milhão de pessoas, mostra que
30% dos profissionais brasileiros desejam ter um trabalho
organizado, com planejamento estruturado de crescimento.
Ainda sonhamos com o modelo de emprego que vigorava na década de 80.
Mas essa preferência não combina com o momento atual, em que as empresas
valorizam, em termos de cargos e salários, funcionários flexíveis,
criativos e focados em resultados imediatos. “É de nossa natureza buscar
o conforto, mas os profissionais que não acompanham as mudanças tendem a
se marginalizar”, afirma Jorge Matos, presidente da Etalent, de São
Paulo.
Muitos executivos se acomodam em atividades que dominam e que lhes
trouxeram sucesso por um tempo. “Os que resistem às transições acabam
presos em queixas e são preteridos nas promoções e constantemente
lembrados nas demissões”, diz Luiz Edmundo, diretor da Associação
Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), de São Paulo. Por isso é tão
importante estar com a mente aberta para se adaptar — só assim você
consegue encarar com leveza e eficiência as várias mudanças de cenário
que vão, inevitavelmente, ocorrer ao longo de sua carreira.